segunda-feira, outubro 29, 2007

Dos conteúdos incontidos


"Tiene más hojas un peral que Buscando el Tiempo Perdido?"

"Por qué se suicidan las hojas cuando se sienten amarillas?"
Será o maduro, o pronto, um ponto de morte ou transcendência ?

"Por qué el sombrero dela noche vuela con tantos agujeros?"

"Es pas la pas de la paloma? E leopardo hace la guerra?"

"Las lágrimas que no se lloran esperan en pequeños lagos?"
E os risos reprimidos viram ecos no vazio do umbigo?

"Por qué en las épocas oscuras se escribe con tinta invisible?"

"Pero por qué no se convence el jueves de ir después del viernes?"

"No es mejor nunca que tarde?"

"Cuántas semanas tiene un día y cuános años tiene un mes?"

"Por qué viven tan harapientos todos los gusanos de seda?"

Assim como eu e tu que tecemos o fio da vida.


"Cómo se reparten el sol en el naranjo las naranjas?"

Como se 're-parte' o amigo, ou vê-se partir o amigo, por entre amigos?


à mais nova e não menos querida

amiga,


Ellen Lira


do Livro das Perguntas de Pablo Neruda e minhas

terça-feira, outubro 23, 2007

Hoje me encontrei com Gaia nessa flor


Minha profissão tem uma certa aura glamourosa, mas para desfilarmos esvoaçantes sob lustres de cristal e sobre saltos agulha, alguém deve edificar esse "habitat".

Ultimamente, tenho sido mais uma, orgulhosamente, entre esses "alguéns" - Pedros Pedreiros (como diria Chico Buarque).

E hoje em visita a uma obra essa figurinha acima me aterriza.
Um presente da Mãe Natureza, a alegrar minha alma, me fazer relembrar o sentido disso tudo...

A imprescindibilidade da Beleza.

Com o perdão da palavra mofada de tão pouco uso, mas na falta de outra mais acertada.... fico com ela:

O Belo é imprescindível para o Universo!

O Belo é imprescindível para a Roda da Vida!

Me emociono às lágrimas ao ver tal prodígio da Natureza.Quanta Sabedoria! Quanta "interoperabilidade", "auto-suficiência", "obsolescência programada"... e todas as -ências e -idades , que poucos de nós, há pouquíssimo tempo, tentamos manobrar, projetar, conceituar.

Junta-se a mais seleta confluência de gênios da humanidade e não consegue-se rivalizar à Perfeição da Existência dessa flor. Tudo nela tem sentido, função, prazo, ordem, hierarquia, poesia, generosidade, compaixão... simplicidade, Beleza enfim.

Quantos milhares de milhares de espécimes da flora e da fauna jamais serão vistos por olho algum e mesmo assim são Perfeitos e Generosos para com o Universo. Para que Ele retribua a mesma Perfeição e Generosidade.

Essa simbiose é a Roda da Vida. Aí está a Divindade.

segunda-feira, outubro 22, 2007

Eu amo, tu amas, ele ama...

E eu, "ocupada em ocupar" os espaços das minhas insônias, em visita ao admirável poeta Fabrício Carpinejar (fabriciocarpinejar.blogger.com.br) me deparo com o texto que se segue.

Texto recente, cheirando encomenda... mas não! São só "coincidências".

E fazem poucas horas, matutava algo acerca da capacidade de o amor, quando declarado, canalizar fluidamente todo o universo no rumo certo a seguir.

O QUE EU DIRIA PARA VOCÊS DOIS

Para um casal secreto de namorados de Concórdia, sem coragem de contar o enlace para suas famílias.


O amor é uma loucura para todos, menos para os dois apaixonados.

A solidão de um apaixonado seria insuportável se não houvesse uma testemunha.

Solidão já é difícil, quando acrescida de segredo não tem cura.

Uma solidão sem acesso. Mais grave do que Barreirinhas no Amazonas, onde só se chega de canoa.

A solidão do apaixonado é uma mentira que cria uma nova mentira para proteger a verdade. A verdade está contaminada. Não há como estabelecer a origem. O apaixonado não andará de gangorra. Não há peso. O desejo emagrece o corpo.

Os apaixonados são inoportunos, indecisos, péssimos amigos. Não procure um apaixonado para falar as novidades. Ele reprisa sua língua. Eles passam o dia fazendo nada. Mas é um nada trabalhoso, um nada polido, articulado, um vazio severo que engole o sono. Pensar no outro é um trabalho urgente para entregar na manhã seguinte. São folhas e folhas em branco, lidas linha por linha. Tentar escrever exige mais revisão do que escrever. Tentar falar exige mais voz do que falar.

Não estão interessados em combater o desânimo. Crescem por surtos. Aumentam por sustos. Os apaixonados são extremamente solitários em suas decisões. Eles não têm como contar o que estão sentindo. Inclusive porque são impressões mais do que fatos. Como narrar estremecimentos, silêncios, hesitações, gestos indiretos? Falta coerência, sobra sentido.

Ensaiam uma conversa ao tomar uma xícara de café, mas o barulho da colherinha afasta a coragem. Qualquer barulho que não seja o do corpo incomoda. O apaixonado caça a transparência e encontra a confusão. Repete a conversa pelo esforço de retomar o fio da meada. Não pode explicar o que está acontecendo - nem ele sabe. Ele não esclarece seus lapsos.

Não poderá falar com o pai, não entenderá. Com os irmãos, não entenderão. Com a mãe, não entenderá. Com os amigos, não entenderão. O terapeuta até entende, mas não vale, representa uma opinião profissional e o amor é destinado aos amadores. O apaixonado evita o julgamento.

Vira um menor de idade, quase a pedir autorização para viajar. Cochicha com os cachorros, os travesseiros e os livros. Foge de si pelos fundos da casa. É igual a um biólogo, obrigado a cadastrar o que não estava procurando. O apaixonado é o material não-identificado que vai para a gaveta.

O amor está errado para todos, menos para os dois apaixonados.

domingo, outubro 21, 2007

Pulsações do Pensamento


Fui perguntada esta semana qual seria minha religião. A resposta foi rápida porém imprecisa: “- Não tenho religião.” A verdade seria dizer: “- Não tenho Igreja.” Religião, no sentido de religar, unir novamente, esta eu tenho.

Desempenho um “labor-atório” contínuo no sentido de recosturar, dentro do meu entendimento, o tecido da humanidade da qual faço parte, desde o mais próximo e através dele, por toda a humanidade.

Encontro no budismo uma porta em que, quando aberta, sua luz não me ofusca a visão. A filosofia budista é o mais próximo que encontrei até hoje daquilo em que acreditava mas não conhecia o nome.

Hoje me considero uma iniciante nos estudos da Filosofia Budista. E foi em busca da raiz dessa linha de pensamento, que encontrei a história de Sidharta (Buda) e sua base hinduísta. Não será esta mais uma porta na busca do Eu desligado do Todo?

Toda existência é dual. O Yng e o Yang. O Ser e o não-ser. O Todo incorpora o Tudo e o Nada. De modo que respostas definitivas são sempre parciais, apenas contidas neste tempo-espaço.

Quando menina vi alguns monges que caminhavam com um espanador longo varrendo à sua frente toda formiga, todo ser vivo que talvez pudesse ser esmagado pelo seus pés. Percebi que o mal estar provocado pela visão do vaso de flores arrancadas inocentemente pelas ruas por minha mãe ou o engasgo de ver um inseto morto, tinha fundamento no princípio da não-violência e tinha seguidores.

Passou a ser mais confortável (e essa é uma das funções da religião) minha atitude agora nominada. Tinha encontrado minha tribo, meu endereço. Como seres gregários e altamente dependentes, fluímos sempre ao encontro de nossos pares, de idéias afins. O que vem explicar a intenção da pergunta que me foi feita.



Dos Fios da União Tereza Freire


Yoga Sutra poderia ser traduzido, grosso modo, como “Os Fios da União”, uma vez que sutra significa "fio", e Yoga, "união". Yoga é um caminho, uma trilha que vai de um lugar a outro, uma direção que escolhemos tomar, uma maneira de agir, e, consequentemente, um destino, um dharma...


E este dharma busca re-unir o homem ao Divino. E, ao conectar-se com o Divino, ele percebe que é igual a este: eterno e completo.


Fio que conduz o homem pelo labirinto e salva-o dos minotauros da vida. Fio que guia o homem de volta para casa...


Os minotauros seriam os nossos vrttis - padrões de comportamento repetitivos que insistimos em seguir porque nos é mais confortável. Confortável porque conhecido. Enquanto o conhecimento do Ser infinito que somos, pressupõe uma jornada em direção ao completo desconhecido. Ao escuro. Pelo menos é o que pensamos...


No entanto, este que nos parece tão distante é quem realmente somos... Mas tanto tempo passamos distantes que nem mais o reconhecemos. Talvez seja esta a grande charada da vida. Desaprendemos tudo que sabíamos no momento em que nascemos, para que, através da dor causada pela ignorância de nosso real estado de plenitude, queiramos nos re-ligar ao divino que somos.


Yoga é um caminho que possibilita a desidentificação com as flutuações de nossa consciência. Nossos vrttis são muitos: os traumas, as frustrações, as expectativas, as obrigações. Tudo nos leva a passar pela vida pulando de galho em galho como macacos na árvore das nossas emoções, inquietos, famintos, e nem sabemos de que... E deixamos de lado vocações e sonhos para cumprir papéis.


Tantos são os personagens que exercemos que esquecemos que esta vida é apenas uma parte de nossa imensa experiência espiritual. É apenas um dos muitos espetáculos de que participamos. E tudo na base da improvisação. Não há tempo de ensaiar para melhorar esta ou aquela cena, muito menos temos um diretor cuidando para que estejamos perfeitos na estréia. Temos que ser one man show em início de carreira: autores, produtores, diretores e intérpretes de nossas vidas. E ainda temos que saber cantar, dançar, representar e fazer malabares se for preciso...
E o Yoga é o fio que nos guia, um farol que ilumina o oceano de nossas turbulências e permite que encontremos o caminho de volta para casa, para nós mesmos...


E este fio pressupõe atitudes, que nos levam a sermos pessoas melhores, cultivando a não violência, exercendo a verdade, respeitando os outros seres e cuidando de nosso Ser através da prática de asanas, do estudo e da meditação. Cultivando yamas e nyamas, podemos nos aproximar dos outros com muito mais generosidade.


A compaixão é a grande razão para estarmos no mundo, concordam todas as religiões. Escolhemos experienciar a vida na terra para amarmos os outros seres e nos ajudarmos mutuamente.


Mais uma vez o fio... Porque tudo está ligado. Assim como é no macrocosmo, é no microcosmo.
Se a natureza vive em perfeita harmonia, se rios e mares, ventos e chuvas, pedras e flores, sol e lua, convivem respeitosamente e se complementam, assim somos nós. Ou deveríamos ser, não tivéssemos cortado o fio que nos liga aos outros, tão envolvidos pela ignorância quanto nós, tão sedentos de felicidade como nós...


Às vezes vejo gente morando na rua, em caixas de papelão e penso: onde está a minha dignidade se permito que outro igual a mim, perca a sua dignidade desta forma? Cada pessoa que morre de fome e frio é uma parte de mim que morre junto...

domingo, outubro 14, 2007

Dos livros, gula e paixões

Minha relação com livros talvez se pareça com a relação do guloso com a comida.


Devoro livros pela capa, pelo título, pelo tamanho, pela cor, pelo formato, pelo tipo de letra, pelas figuras, pelo sabor - conteúdo, pelo preço, pela disponibilidade....


Tem quem não consiga passar por uma padaria e não comer um quitute. Eu não passo perto de "papéis escritos" sem tirar um gostinho, nem que seja folhear, sentir o cheiro...


Sim, livros assim como vinhos, acusam sua idade, sua história, por onde passou, quem os manipulou, pelo cheiro. Eu também leio o cheiro dos livros.


Ou pelo menos lia, quando era "rata de sebo" . Pela prática, aprendi reconhecer informações sobre um exemplar apenas pelo estado das lombadas - idade, uso, gênero do antigo dono, seus hábitos durante a leitura, além dos dados escritos obviamente.


Bibliotecas me dão muito prazer, mas algo limitado, já que a ética não permite grifar, fazer anotações, encher a mesa com vários exemplares e experimentar um pouquinho de cada....


Hoje li "Memórias de minhas putas tristes" de Gabriel Garcia Márques. Peça adquirida quase que por "inseminação artificial" - comprei-a pela Internet, assim como para fazer volume num outro pedido, aproveitar o frete grátis acima de tantos reais, enfim, essas realidades...


Estou tentando aprender a garimpar delícias em um ambiente insosso - o único que me resta por essas paragens.


Talvez por esse aspecto não terei muitos entraves. Como dizia meu antigo companheiro: - Nisso, qualquer paixão me diverte!....


Sorte a minha!

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O protagonista é um jornalista que acaba de completar 90 anos e resolve comemorar seu aniversário no cabaré que freqüentou a vida toda, encomendando uma virgem de 14 ou 15 anos, por quem se sente impulsionado à paixão.


do livro de G.G.Márques :



"....a moral é uma questão de tempo.... "


"....desde muito menino tive mais bem formado o sentido do pudor social que o da morte..."


"Nunca me deitei com mulher alguma sem pagar, as poucas que não eram do ofício convenci pela razão ou pela força que recebessem o dinheiro nem que fosse para jogar no lixo."


"....e fazíamos amores sem amor, meio vestidos na maior parte das vezes e sempre na escuridão para imaginar-nos melhores...."


"Mesmo quando não preciso escrever, todas as manhãs arrumo a mesa com o rigor ocioso que me fez perder tantos amores. Ao alcance da mão tenho meus livros cúmplices...."


"Acho contra a natureza que um homem se entenda melhor com seu cão do que com sua esposa, que o ensine a comer e a descomer na hora certa, a responder perguntas e compartilhar suas penas.(!)"


"Graças a ela enfrentei pela primeira vez meu ser natural enquanto transcorria meus noventa anos. Descobri que minha obsessão por cada palavra em seu estilo, não era o prêmio merecido de uma mente em ordem, mas, pelo contrário, todo um sistema de simulação inventado por mim para ocultar a desordem de minha natureza. Descobri que não sou disciplinado por virtude, e sim como reação contra a minha negligência; (....)que só sou pontual para que ninguém saiba como pouco me importa o tempo alheio. Descobri, enfim, que o amor não é um estado da alma e sim um signo do zodíaco. (....)"


" Me pergunto como pude sucumbir nesta vertigem perpétua que eu mesmo provocava e temia. Flutuava entre nuvens erráticas e falava sozinho diante do espelho com a vã ilusão de averiguar quem sou.(...)"




segunda-feira, outubro 08, 2007

dos mitos e alforrias

Se já soubesse quem sou

Te saberia. Como não sei

Planto couves e cravos

E espero ver uma cara

Em tudo que semeei.

Pois dizem que te mostras

Por vias tortas, nos mínimos?

te mostrarás na minha horta

Talvez mudando o destino

Dessa de mim que só vive

Tentando semeadura

Dessa de mim que envelhece

Buscando sua prórpia cara

E muito através, a tua

Que a muito me apeteceria

ver frente a frente.

Há luas luzindo o verde

E luas luzindo os cravos.

Couves de tal estatura

E carmesins dilatados


Que os que passam me perguntam:

São os canteiros de Deus?

Digo que sim por vaidade

Sabendo dos infinitos

De uma infinita procura

De tu e eu.




Hilda Hilst em Poemas malditos, gozosos e devotos

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Tenho muitas boas lembranças da época do primário em colégio de freiras.



Certa ocasião, Irmã Maria Fernanda, falando de não sei o que, disse-nos - (a uma classe só de meninas, de 8 ou 9 anos ):



"- Seja lá o que for que estiverem fazendo e para quem estiverem fazendo, faça-o com a certeza de que Jesus está vendo absolutamente tudo!"



Era apenas para nos estimular a fazer as coisas bem feitas, mas isso me impressionou fortemente. A onipresença. A onisciência então... nem se fala. Me pegou pelo pé!



Interessante.... Cresci com o hábito de tentar sempre fazer bem feito tudo a que me proponho.



Mas, ahhhhh como é fun-da-men-tal a liberdade do anonimato e auto-satisfação!!!!!!






segunda-feira, outubro 01, 2007


Não que seja a primeira nem a única vez que isso tenha ocorrido.

Sim talvez essa seja uma rara ocasião, quase um acaso, eu estar com os olhos bem abertos neste exato momento em que o mundo passou a girar trazendo o Sol inteiro para clarear meu caminho.

A sensação é de ter ganho o grande prêmio sozinha. É tão maravilhoso... É como se um bebezinho tivesse adormecido embalado em meus braços e agora deixá-lo no berço é um risco, uma perda mútua. E esse "ser" - sou eu, pura e legítima criação própria.

Fez lembrar de minha grande amiga, Regina e sua música tema:

Arlindo Jr, "Pesadelo dos Navegantes"

"alçar as velas
desaportar as caravelas
esquadras do velho mundo
do oceano rio-mar

alçar as velas
desaportar as caravelas
cruzadas do novo mundo
fé, império a dilatar

o vento te leva
há ventania
as noites te envolve agonia
do grande abismo que virá

das feras das águas
que seria
pesadelo de conto
navegador
lê, lê

terra à vista
atracar
ilhas dos tupinambaranas
terra dos tupinambás

aportar nos braços do
orteiro
de joelhos e bravos
guerreiros
celebrai a grande missão
com salva de tiros demorteiro"